quarta-feira, 30 de setembro de 2009

olho as tuas fotografias e não me consigo recordar
de quando o teu rosto era aquele que me olha nelas
como queria agarrar-te para sempre embalar-te
e preservar-te nesse estado em que ainda sou tanto para ti

amo-te mais do que consigo exprimir
e assusta-me não ser aquilo
que os teus olhos vêem
trago oculta em mim a angústia do momento
em que entenderás que eu nunca
consegui viver à altura do que poderia
ter sido

não sabes a tristeza que carrego e que
não quero nunca que seja tua
nem as noites que prolongo perdido em busca
de algo que nem consigo definir na imobilidade

vivo suspenso entre a realidade que sou e o vislumbre
da minha probabilidade e aí
perco-me na indefinição da hipótese e da capacidade

não conseguirás entender a sucessão de registos temporais
que de ti guardo até tu própria vivenciares os teus
e aí já o tempo sem perdão se terá encarregado
de quebrar os laços

não imaginas o que consigo ver no teu futuro
e como a sua luz contrasta com
o que vislumbro no meu

vivo com o fantasma de uma oportunidade niilista
aguardo a chegada do fim com a convicção
do nada que ele encerra e assim emoldurado
projecto a angústia e urgência da vida
enquanto engatilho e aponto as minhas armas a um alvo
que projecta o seu apelo desde o infinito
sempre tão ilusório

mas disto ainda nada sabes tudo ainda
encerra em si o maravilhoso da descoberta
tudo se reveste de uma película de novidade e albergo-te
sob esta asa protectora que a seu tempo desejarás
não sentir

e nessa distância inevitável da vida sinto
uma nota que vibra infinitamente ressoando
por intermináveis corredores onde o tempo
é medido por afastamentos e não duração
onde o trajecto das vivências acarreta
fronteiras incomensuráveis solidão transfigurada
pela busca de um sonho mas digo-te
nada disto é real nada disto realmente importa
quando na verdade apenas existimos na busca dilacerante
por aquilo que já fora nosso quando ainda não o sabíamos