terça-feira, 15 de novembro de 2011

noite. é neste silêncio que eu procuro o som.
naquele momento em que o ruído de fundo sobrevem
e nos apercebemos que, na realidade, não existe silêncio.
aquela hora em que a cidade aparentemente dorme a meus pés
mas emana um pulsar constante.
o pulsar eléctrico de mil máquinas "silenciosas" em funcionamento.
o pulsar dos corpos que, aqui e ali, se buscam e se debatem.
o pulsar de choros refreados, de tragédias pessoais, de desalentos e amargura.
um pulsar grave,... contínuo,... lento...
pudesse um único som resumir a nossa existência e seria
o de uma estrela a ser sugada para o vórtice.
uma força voraz que não atende aos desejos, cega ao passado.
deus?
no vazio o som não se propaga...

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

que a noite te encontre já imersa nas sombras
não temendo o seu avanço
e da música apenas reste
a cadência soturna que, abafada, anuncia o fim.

and may the faintest beams of light
spreading on the shores on an autumn twilight
find you on the beach, warming you,
while you stare into the sea.

porque a hora do fim será sempre sombria
e nada nos resta senão aqui e agora.
e tudo o que quisermos sorrir, dizer e amar
deverá ser gravado aqui.

for there is no god above nor afterlife,
no injust punishment nor eternal reward,
all that may be, you see, is circumscribed
in an arch spreading from birth until the final goodbye.

que a hora esteja distante
mas que não te detenhas na espera...

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

é o silêncio que paira sobre tudo isto.
um silêncio denso. como que uma muralha
que, após ser construída, foi sendo reforçada
ano após ano.
irónica figura de estilo, por nessa muralha
estar na verdade a única saída, a única voz...

é o vazio que domina isto tudo.
um vazio imenso. como se nos sentássemos
no fim do universo e pudéssemos ver
todo o vazio que existe para além.
todo o vazio que nada é, que tudo poderia ser.
estranha figura de estilo, por esse vazio
ser o que na verdade me preenche,
que propaga a minha voz...

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

desço agraciado pelas sombras,
na solitária companhia dos vultos
que o tempo esqueceu.
solícitos na sua compreensão, rejeito porém
os ombros que me oferecem.

nunca estou em paz! nem estes vultos
que comigo ombreiam,
contando comigo para sua memória
vislumbram o opaco vazio que me assoma.

não sou alfa nem omega, apenas a fugaz impressão
de algo que não foco.
um corpo à deriva até passar o limite último
deste sistema
e enveredar pela trajectória do oblívio.
quem era? existiu? nada ficou!...
... ... ... ... ...

sorri, enquanto for essa a tua hora
e a grandeza da tua sombra crepuscular
vencer o mais alto edifício que te acerque.
após isso, resta-nos... nada...

sábado, 2 de abril de 2011

esta é a noite sem sono.
das horas perdidas e do tempo gasto
incapaz de descortinar ou criar algo.
esta é a noite sem destino,
sem vislumbres, voz ou acção.
esta é a noite do silêncio,
quando os demónios se erguem e as sombras
se abatem.

esta é a noite (mais uma noite)
em que a guitarra não soa,
o seu vagaroso timbre a preencher as trevas.
esta é a noite vã.

esta é a noite da profunda apatia,
do insistente roçar na madeira
das unhas quebradas do sonho gasto.

esta é a noite em que vos ouço a dormir
e tento aninhar-me entre o profundo respirar
do vosso sono
e espero, e espero
entrelaçar nos vossos sonhos a memória
do edifício que erigimos em conjunto e espero
que a vossa beleza se entrelace com a minha angústia
e os vossos sonhos se entrelacem com o meu desespero
e um dia, um dia eu espero
que esta noite seja longínqua,
mais em memória que tempo,
e possamos olhar para aquilo que tecemos
e antes do fim da jornada achar
que valeu a pena.

esta é a noite em que sento e penso,
a noite em que não chego a parte nenhuma.
esta é a noite
só a noite
só mais uma noite...

quinta-feira, 24 de março de 2011

hoje as sombras alongam-se e a noite silenciosa
carrega o estertor de casa em casa sem saber ler
na porta a marca dos justos.
hoje o ar adensa-se até um clímax inalcançado
e os sussurros gerarão o grito morto prematuramente.
hoje a vida esvai-se, sangra-se o futuro e contam-se as armas.
hoje a rua em chamas celebrará o fim.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

ouve-me. sou a tua voz, de novo, aquela que te encontra
no contínuo sussurro que não sossega.
ouve-me. é de novo a voz do abismo que te chama.
a tua companhia constante nas descidas ao subterrâneo.
ouve-me. quanto tempo se passou? foram semanas, meses?
tudo se concentra neste momento.
a hora em que a mente divaga, o olhar fixo penetra o vazio
e a mão automática pega na caneta e mancha o papel.
sim, o papel, essa tela onde se imprime a fúria, a incerteza, o erro.
esse quente registo humano, físico como eu, a voz que sussurra.
que observa, que toma notas, que vai tecendo a tapeçaria
na qual te deitas nos teus momentos de grave solenidade, de desespero, de tristeza.
a tapeçaria onde te deitas e sentes todos os seus filamentos
a procurarem contacto com esse corpo, essa mente de onde saíram.
ligação directa ao centro nevrálgico da experiência.
onde a vida se preenche no contorno das cicatrizes que sulcam a superfície
no planalto da loucura.
sim, é do físico que se fala. esta é a escrita da terra.
é a marca impressa na lama seca quando o fogo desvaneceu
a beleza primordial da água e o vento expôs a crueza do solo árido.
ouve-me... eu sou o sussurro que percorre o deserto e te mostra
a entrada da caverna.
ouve-me... e sente na carne a dor dos primeiros passos
quando almejas as estrelas mas a queda te recorda o teu verdadeiro lugar.
ouve-me... envio-te sílabas soltas no vento, embalo-te na água e
seduzo-te no fogo. ouve...
o caminho está para lá das montanhas, nas falésias que o vento
acaricia e molda nas suas investidas.
o caminho está para lá dos oceanos que vêm a aurora.
o caminho está onde tu estás...